quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Amores virtuais

Depois de tanto namorar a fachada do tal café, decidiu, finalmente, entrar. Estava cansada de comer sempre nos mesmos lugares e era um daqueles dias em que ela "precisava" de um bom café da manhã.

Sentou e, antes mesmo de pedir o cardápio, sacou o celular pra fazer o check in e lá estava ele. De novo. Quando não era o prefeito do lugar, tinha sempre uma dica sobre alguma coisa supostamente imperdível, do atendimento à sobremesa, passando por uma descrição elaborada do café.

E ela adorava suas sugestões.

No começo, só achava curioso encontrar aquele mesmo rosto nos lugares que frequentava. Todos nos arredores de sua casa, o que provavelmente significava que eram vizinhos. Ou que ele trabalhava por ali. Ou coisa parecida, que tornasse necessária a sua presença por ali com muita, muita frequência.

Parecia saber de cor todos os cardápios.

Com o tempo, desistiu de apostar nas coincidências e começou a procurar suas recomendações. Seus gostos eram tão parecidos que ela passou a deixá-lo escolher seus almoços, seus drinks, suas sobremesas. Era como se a conhecesse e soubesse como fazê-la feliz.

E, mesmo depois de tanto tempo, ele ainda acertava. Mais impressionante, ele ainda conseguia surpreendê-la.

Sua grande frustração, esse tempo todo, foi nunca tê-lo visto pessoalmente. Frequentavam os mesmos lugares, gostavam das mesmas coisas, mas sequer sabia como ele era. A foto do avatar com certeza não dava margem nem para sua imaginação.

Mas aquele dia era diferente. Pela primeira vez estavam no mesmo lugar ao mesmo tempo. Olhou em volta, tentando adivinhar quem poderia ser sua alma gêmea. Ninguém por ali se parecia, mesmo que minimamente, com aquele passarinho amarelo amigo do Snoopy.

Então decidiu dar o primeiro passo naquele relacionamento. Respirou fundo e o adicionou como amigo no Foursquare.


segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Limites

- O que você tá olhando?

- Essa caixa. Tô tentando entender como consegui ficar aqui dentro tanto tempo.

- Achei que você fosse feliz aqui dentro.

- Eu também. Mas acho que fazia por você. Eu nunca soube escrever com esqueleto, desenhar dentro do modelo, fazer as coisas assim tão fechadas. Te amava tanto, te amo ainda, que achava que valia a pena. Que não me incomodava. Talvez só não conseguisse ver direito daí de dentro. É tão pequena essa caixa, né?

- Ah, ela não é tão pequena assim, olha.

- É sim. Você não sabe como é difícil se apertar nesse espacinho com tanto medo seu. Não era só eu. Era muita coisa. E cada dia parecia aparecer uma coisa nova. Fiz muitos amigos aí dentro, é verdade. Seus amigos. Antigos, alguns muito antigos. Sei nem se você sabe que eles estão morando lá há tanto tempo. Se sentem donos do pedaço, sempre me deixaram claro isso. Que eu podia até estar lá, mas que não seria pra sempre. Posso estar louca, mas tinha dias em que os olhava e achava que estavam maiores. Sei lá. Posso estar louca. É muito claro aqui fora. Tem espaço. Sei lá.

- Desculpa.

- Esquece. A porta tava aberta. Eu entrei. Podia ter saído. Não quis. Me acostumei tanto a ficar lá que achei mais prático até tentar redecorar. Te vi várias vezes lá dentro, mas você nunca quis conversar. Ficava num canto, fechado. Nunca quis forçar. Mas te vi lá dentro.

- É... Acho que eu nunca reparei que era assim. Tão apertado. Tão complicado.

- Você pode arrumar as coisas. Se quiser. Mas eu não posso fazer por você. E não quero. Não conseguiria  viver bem com essas paredes em cima, em volta de mim o tempo todo. Mas sabe...

- Fala.

- Eu fico pensando. Se você conseguisse sair. Se achasse o caminho. Se a gente se encontraria de novo aqui fora.

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Faxina

Ela abriu o armário e começou a se arrumar. Pegou o vestido novo, ainda na caixa, e rasgou a embalagem sem dó. Calçou o sapato de festa, pegou até aquela bolsa que nunca usava. Lançou mão da maquiagem mais cara, do melhor perfume, parou pra ajeitar o cabelo no coque impossível que tanto namorava em revistas de moda. Pra fechar, obviamente, as jóias de família que nunca souberam que havia vida fora do cofre.

Olhou-se no espelho e já ouviu a vozinha no fundo.

- Vai sair?

- Não, estou arrumando a casa - respondeu, vassoura em punho.

- Precisa isso tudo só pra arrumar a casa?

- A casa tava precisando, olha essa zona. Como vou receber gente aqui? - abriu a cristaleira e puxou os pratos da avó, porcelana, borda folhada a ouro.

- A porcelana? Vai ter festa aqui hoje?

- Nada, só uns amigos, vou fazer cachorro quente.

- Vai usar o jogo de jantar completo pra servir cachorro quente? A sopeira também?

- Pensei em botar o molho aqui. Acho que vai ser legal servir assim, é bonito, não acha?

- Você tá bebendo?

- Só tomando um vinhozinho pra relaxar.

- O vinho que tava guardado pra quando eu conseguisse uma promoção?

- A promoção nunca vinha, mas eu tava com vontade de beber um vinho. Só tinha esse. Você não se importa, né?

- É que...

- Sabe, é que eu cansei. Cansei de guardar as coisas pra outra hora, prum momento especial. Pra sua promoção, praquela comemoração, cansei. De não ter jantar importante o suficiente pra usar esses malditos pratos. A verdade é que eu nem gosto deles. Nunca gostei. Odeio essa expectativa, sabe? De esperar que algo melhor aconteça pra aproveitar. Tô achando ótimo varrer a casa com esse vestido que você me deu e pediu pra eu usar só quando a gente fosse naquele restaurante que não faz reserva. Sabe por que? Você não tem tempo.Ou não tem vontade, sei lá. Juro que nunca sei.

- Não é isso...

- Não me importa. Sério. Eu não quero ficar adiando. Não quero viver nessa expectativa escrota. Qual o problema com o agora? Em botar uma roupa nova pra ir na padaria? Só porque você tá comigo? Ou pra trabalhar, porque foi você quem me deu a merda da blusa e eu gosto dela o suficiente pra acreditar que, só de vesti-la, um dia que tinha tudo pra ser uma bosta pode ser melhor?

- Calma, posso falar?

- Sabe de uma coisa? Não. Não pode. Você já falou tanto. Eu só quero terminar essa faxina, ajeitar as coisas, olha essa bagunça. Já já toca a campainha. Além do mais, você não tá aqui. Me deixa fazer as coisas do meu jeito.

Quebrou um prato, só porque podia, e foi terminar o cachorro quente antes que as visitas chegassem.

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

~brisando~


Eu queria viver pra sempre naquela gargalhada da foto que todo mundo adorou.

Queria que novembro nunca acabasse, pra não ter de me despedir.

Que as pessoas não perguntassem se está tudo bem, a não ser que realmente quisessem saber.

E que a resposta sempre fosse “sim, tá tudo lindo...”

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

roda

Palavras soltas na cabeça, tentando achar o caminho da ponta dos dedos.

Dançando ciranda em busca de sentido.

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Idas e vindas

Abro a porta pra que você saia levando parte de nós.

Para que possa ser você sem mim.

Fecho a porta para que eu possa ser eu longe dos olhos dos outros.

Sem você.

Sem nós.

Sem maquiagens.

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

sábado, 25 de junho de 2011

quinta-feira, 23 de junho de 2011

projeção

Chorava pela emoção dos outros por medo de que nada daquilo acontecesse com ela um dia.

domingo, 15 de maio de 2011

(des)equilíbrio

Por longo tempo ficou desempregada, quase não fazia coisas para ver se economizava o dinheiro, sua rotina não  garantia muitas histórias para contar.

Agora trabalha de novo. E trabalha muito. Suas histórias giram praticamente todas em torno do que faz.

Talvez o problema seja mesmo ela ser chata demais.

segunda-feira, 18 de abril de 2011

Tempo II

Todos diziam pra que vivesse o presente, então nunca se permitiu pensar no futuro. 

O tempo passou e ela não fez nada do que queria ter feito. 

Nunca realizou nenhum de seus sonhos.

quarta-feira, 13 de abril de 2011

terça-feira, 5 de abril de 2011

parceria

Ele pediu que ela ficasse. Ela foi embora. 

Não queria ficar só porque assim seria mais fácil.

Sabia bem que praticidade não era amor.

quarta-feira, 16 de março de 2011

Criação

Dedicava-se tanto a cada personagem escrito que, às vezes, esquecia que eram apenas ficção.

quarta-feira, 9 de março de 2011

Amor?

Ô, coisa difícil hoje em dia esse negócio de amor. Não desses amores instantâneos que se declaram a torto e a direito por aí, como se só precisasse adicionar água quente e um tantinho de tempero, mas daqueles de dar gosto, de durar uma eternidade. Ou uma intensidade, como pretenderia o poeta.

Não há mais amor à causa, ou à camisa. Amor não tem gosto, cheiro, forma ou cor. Não dá pra tocar, pra descrever, é um disse me disse danado. Não dá pra tirar foto e compartilhar nas redes sociais, pra todo mundo ver que você tem e eles, talvez, não.

Amor não tem etiqueta, grife, não está na moda, as amigas não podem morrer de inveja.

Não dá pra morar nele, ou dirigi-lo até um lugar bacana pra todo mundo ver que você tem.

Não tem de todas as cores e tamanhos, não vem coberto em prata, ouro, platina, sequer chocolate!, cravejado de brilhantes ou cristais Swarovsky. Tem nem como avaliar, botar um preço, levar a leilão. Não serve de investimento, seu valor não rende nada ao longo do tempo.

Deve ser por isso que ninguém mais sabe o que é, ou entende quando sente. Algo assim, tipo gentileza ou vergonha, acho que se perdeu em meio a tantas outras coisas, como a falta de tempo.

terça-feira, 1 de março de 2011

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Abandono

Tinha tanto medo de ser deixado novamente que não poderia imaginar que a dor maior seria a de ir embora.

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

O Paninho Verde

O paninho verde foi visto pela primeira vez nas cercanias do quarto andar, encolhidinho no canto de um degrau. Todos passavam por ele e torciam o nariz. Era sujo e parecia muito usado, mesmo que ninguém soubesse exatamente pra que.

De onde tinha vindo o paninho verde, afinal?

O desprezo dos outros o afetava, era fácil perceber. Pobrezinho, se arrastava sem vontade pela escada. Tomava períodos longuíssimos para andar um tiquinho a mais. Coisa pouca mesmo. Em dois dias, sequer tinha conseguido chegar ao terceiro andar.

Estava obviamente em fuga, mas faltava vontade para chegar a algum lugar. 

E onde queria chegar?

Pois, enquanto o coitado caminhava em sua indefinição, uma menina passou por ele e enxergou potencial. Justo naquele dia, em que ela decidiu trocar o elevador pelas escadas, lá estava o paninho verde. 

Então ela o levou para casa, o lavou com um suave sabão líquido e um belo amaciante.

Hoje ele ocupa lugar de destaque em seu aparador, logo abaixo do pote de vidro onde joga as chaves assim que chega em casa. 

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Mais um pouco

Chegou em casa cansada. Na geladeira, o suco. No freezer, a vodka. Estava cansada, mas a cabeça não parava. Só conseguia pensar no dia seguinte, no resto da semana, em tudo que ainda tinha pra fazer. Estava cansada, mas o sono nunca vinha.

Só um gole. Pra relaxar.

Bebia e ensaiava as palavras do e-mail que precisava mandar, fazia as contas do relatório que tinha de entregar, tentava lembrar se tinha salvado aquele arquivo, se tinha desligado a máquina e trancado a gaveta. Ainda tinha chá preto na gaveta? E os bombons pra beliscar nos intervalos que se forçava a fazer?

Só mais um copo. Pra tentar esquecer.

Merda. O sono não vinha. A cabeça não parava. E os pensamentos, malditos, não se acalmavam. No fim das contas, começaram a se misturar. Entre eles e com a saudade.

Acabou o suco. Pior, acabou a vodka.

E ela continuava. Só.

segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Sem

Tantas coisas não ditas por preguiça, medo de ser mal entendido ou não ser correspondido.

Palavras que ecoaram só em sua cabeça, diálogos não ocorridos.

Oportunidades perdidas.

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Ato falho

Resíduo de uma vida em comum, ficou o engano de chamá-la de amor ao fim de uma breve conversa ao telefone.

sábado, 15 de janeiro de 2011

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Fachada

Para todos, eram o casal perfeito, coisa de revista mesmo, nenhuma falha pra apontar.

Mas ele, sempre que os via, não deixava de pensar:

"Ao menos, meu amor era sincero".

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Negação

Às vezes debochava do quanto as mulheres conseguiam ser tão tolas.

Tantas outras, apenas queria as mesmas coisas que elas.