quarta-feira, 23 de junho de 2010

Insosso

Volta e meia, se pegava pensando em como explicar a ele que todo aquele seu destempero causava nela tamanho dissabor.

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Inversão

Foi triste perceber que a ela faltava maldade.

Por uma questão de sobrevivência, ela precisava ser pior.

terça-feira, 15 de junho de 2010

Mingua

-Você vê o coelho na lua? - perguntou o rapaz. - Quem vê o coelho é porque está apaixonado.

-Claro. Um coelho. Estou vendo!

Era mentira. Ela só via uma grande bola de queijo. Mas isso explicava muita coisa.

sexta-feira, 11 de junho de 2010

Engasgo

Ela o observava com agonia, parecia ter dificuldade em respirar, ou coisa assim.

-Você está bem?

Ele nada dizia.

-Você parece entalado, sufocado, com alguma presa na garganta.

Ele apenas se debatia.

-Bota pra fora, vai te fazer melhor. Vai...

Ele tossiu, bateu no peito, tentou, tentou, até que saiu.

-Eu... Eu... Eu te amo!

Ela o fitou por alguns instantes e, cheia de compaixão, o abraçou.

-Calma, vai passar... Vai passar...

terça-feira, 8 de junho de 2010

Interpretações

Toda hora se encontravam pelos corredores do prédio, e ela sempre ficava com a impressão de que a vizinha a observava. Mais ainda, que a julgava.

Pegando a correspondência.

“Lá está ela, recebendo aquelas revistas intelectualóides, deve estar me achando uma imbecil porque leio essas revistas de dieta e exercícios. Deve achar que eu sou fútil e não me preocupo com nada importante.”

Jogando o lixo fora.

“Ela separa lixo. Eu queria separar lixo, mas não sei o que vai com o que, onde deixo, pra onde vai, o porteiro não sabe me dizer, também não vou perguntar pra ela, senão ela vai deixar de achar pra ter certeza de que eu sou uma besta ignorante. E essas caixas de comida pronta, lasanha, sacos de fast food, agora ela acha que eu só como porcaria, por isso sou gorda.”

No elevador.

“Bicicleta. Ela anda de bicicleta. E eu não saio nem pra caminhar. Claro que ela deve me achar uma gorda fútil que não recicla, uma preguiçosa que só come porcaria. Enquanto isso, ela vai de bicicleta pro trabalho. Aposto que tem essas sacolas recicladas bacanas pra ir ao supermercado e só compra orgânicos e comida integral e...”

-Oi.

-Ahm, oi.

-Você mora no apartamento do meu lado, né?

-Sim.

-A gente sempre se esbarra, eu sempre tive vontade de falar com você, mas você sempre passa muito rápido, está sempre com pressa.

-Ah, não, é que...

-Tudo bem, eu só queria me apresentar e perguntar se você de repente não gostaria de passar lá em casa mais tarde, quando você chegar do trabalho, quem sabe. Eu vou fazer uma massa, tomar um vinho.

-Ahm, erm...

-Você é quem sabe. Eu só acho você linda, sempre quis ter coragem de falar com você, te conhecer melhor. Quem sabe...

-O elevador...

-Ah, obrigada. Bom, se você quiser, massinha, vinho. Apartamento 101.

...

terça-feira, 1 de junho de 2010

Canção de roda

O bule que me deu se quebrou.
Caiu no chão e se desfez em caquinhos.
Era vidro, era frágil.
Como o seu amor.
Era pouco.
Se acabou.